1) Porque às vezes ficamos com os olhos marejados após uma
gargalhada?
Resposta: Desconhecemos razão empiricamente comprovada para
este fenômeno bem conhecido. É comum encontrar-se uma explicação do tipo
biológico para este fenômeno. O sistema límbico, que é uma região central do
cérebro, a mais primitiva na evolução deste órgão, é considerado a sede das
emoções mais básicas ou primitivas, entre elas a dor, o prazer, o desejo, a
raiva. Se este é o “órgão emocional”, então o choro e o riso poderiam ser
produzidos concomitantemente por este “órgão”, se ele fosse muito fortemente
ativado por estímulos. A explicação não me agrada nem um pouco, pois é
inconsistente com nossas observações – por que então observamos apenas a
concomitância entre choro e riso, e não entre riso e... raiva, por exemplo?!
Uma maneira alternativa de especular, fundada numa
perspectiva psico-emocional, e, portanto, mais empírica e comprovável, porque
todos podem ter acesso a esta experiência, dá conta de que o choro que
acompanha o riso fala de uma dor que acompanha um gozo ou prazer. Não raro o
humor representa o alívio de um perigo ou temor que, em lugar de se abater
sobre nós, abate-se sobre outra pessoa, de quem então rimos, como nas
palhaçadas e nas “comédias de pastelão”. O choro sinaliza a evocação da dor,
vivida ou antecipada (“alucinada”, imaginada) pela coisa que nos provoca o medo
(do ridículo, do abuso, do maltrato, da agressão, da humilhação) e o riso
sinaliza o prazer do alívio de que, desta vez, o infortúnio não nos atingiu,
mas a outrem – o que torna nosso medo mais real, e alívio mais intenso.
2) É normal que isso aconteça?
Resposta: É sintomático, na medida em que traduz particularidades da experiência íntima da pessoa frente àquilo que lhe desencadeou o riso .
3) Pode sinalizar alguma doença?
Resposta: A alternância entre choro e riso, e a mistura de
choro e riso de modo excessivamente frequente, provocada por qualquer estímulo
de conteúdo emocional mínimo, é tipicamente manifestação de uma doença cerebral
– a chamada Paralisia Pseudo-Bulbar. Além desta resposta emocional peculiar, se
acompanha, comumente, também de uma propensão do paciente a se engasgar
fortemente com pequenos estímulos à deglutição (engolir) de alimentos ou
líquidos, como se estivesse se afogando, mas, na verdade sem risco real,
resultado de uma hipersensibilidade e reatividade exagerada da proteção
laríngea contra a asfixia por líquidos ou alimentos. Comumente decorre de
múltiplo pequenos infartos cerebrais. Pode ser tratada com medicamentos
psiquiátricos – ao menos seu componente emocional (labilidade afetiva intensa)
– com o cuidado para que os próprios medicamentos não tornem a pessoa mais
propensa ainda aos sucessivos episódios isquêmicos-cerebrais que lhe servem
comumente de causa.
* Dr. Sander Fridman é neuropsiquiatra,
psicanalista cognitivista e psiquiatra forense. É o responsável técnico pela
Clínica das Depressões no CM Adventista Silvestre. Foi o diretor científico e
organizador do Serviço de Doenças Afetivas (SEDA) da Santa Casa de Porto Alegre
de 1991-1996.